Gelo? Ou calor? Em que situações?
Uma das dúvidas mais frequentes que surge no nosso dia-a-dia prende-se quanto à aplicação de calor ou gelo em caso de lesão. Neste artigo pretendemos clarificar e explicar os efeitos destes agentes físicos.
O gelo é preferível em situações traumáticas agudas, ou seja, quando a lesão é recente (nas 24 a 72 horas seguintes) e quando estão presentes sinais inflamatórios como dor, aumento da temperatura da pele (calor), vermelhidão (rubor) e inchaço (edema).
Ao atuar como um vasoconstritor, o frio diminui o fluxo sanguíneo local, reduzindo o extravasamento de líquido para o espaço intersticial. Este efeito é reforçado pela redução da atividade metabólica e enzimática. Desta forma previne-se o transporte de células inflamatórias e substâncias responsáveis pela sensação de dor à área afetada. Justifica-se assim o efeito anti-inflamatório e de controlo do edema e formação de hematoma da aplicação de gelo (crioterapia).
Ao arrefecer a temperatura da pele, a velocidade de condução dos nervos periféricos locais é reduzida. Para além disso, ao percecionarmos a sensação de frio, esta pode sobrepor-se à sensação de dor, aumentando o seu limiar. Isto traduz-se num efeito analgésico a curto prazo, com possível diminuição da dor e dos espasmos musculares.
A aplicação de frio, ao ajudar a controlar o edema (muitas vezes o fator limitante da recuperação) e a reduzir a dor, pode potencialmente melhorar a amplitude de movimento e a função.
Após o exercício físico intenso, a crioterapia, ao reduzir o fluxo sanguíneo e diminuir o metabolismo nos músculos atingidos, pode atenuar a resposta inflamatória decorrente do mesmo, prevenindo dano muscular secundário e ajudando a melhorar a recuperação pós-exercício.
No entanto, devemos ter presente que tudo o que diminui a resposta inflamatória, também atrasa a cicatrização, uma vez que o processo inflamatório é um aspeto essencial da cicatrização em si.
Existem várias formas de crioterapia, tais como bolsas de gelo, compressas geladas, massagem com gelo, imersão em água fria, sprays, entre outras.
O recomendado é, para uma bolsa de gelo normal, a sua aplicação entre 10 a 15 minutos, com intervalos de pelo menos 30 minutos entre aplicações para deixar a pele aquecer novamente. Um período prolongado de frio na pele, devido à redução do fluxo sanguíneo local, pode resultar em morte tecidular ou mesmo em danos permanentes nos nervos. Atenção que a aplicação não deve ser diretamente na pele, pois o gelo também pode provocar queimaduras!
A utilização de gelo pode, portanto, ser vantajosa em caso de entorses (tornozelo, joelho, punho, etc.), contusões (pancadas), luxações, pós-operatórios.
As contraindicações ao uso de gelo são: doença vascular periférica (arterial ou venosa); Síndrome de Raynaud; alterações de sensibilidade, como na neuropatia periférica (Diabetes, p.e.), feridas abertas e aversão ao frio.
O calor pode ser usado quando estamos perante lesões mais antigas (sub-agudas ou crónicas).
O calor, pelo seu efeito vasodilatador, aumenta o aporte sanguíneo e o metabolismo, estimulando o transporte de oxigénio e nutrientes às células, potenciando a saída dos resíduos metabólicos e a reparação dos tecidos da área lesada mais rapidamente. Uma vez que aumenta a circulação, o calor pode piorar a inflamação e edema, pelo que só deve ser usado quando os sinais inflamatórios acima referidos, não estiverem presentes!
A terapia pelo calor (termoterapia) tem também o poder de reduzir os espasmos musculares, produzindo um efeito de relaxamento muscular e consequente diminuição da dor. Como tal, prevê-se útil no tratamento de contraturas musculares, que não são nada mais que pontos com pouca vascularização, que beneficiam da capacidade de vasodilatação e aumento da circulação periférica do calor, para os irrigar e relaxar.
Para além de aliviar a rigidez muscular, aumentando a extensibilidade dos tecidos, o calor diminui também a rigidez articular, graças às alterações que provoca na viscosidade do líquido sinovial, melhorando assim a amplitude articular/mobilidade e a função.
Antes do exercício o calor pode ser benéfico para prevenir ou diminuir as dores musculares decorrentes da sua prática, bem como para restaurar a função muscular pós-exercício.
O estímulo térmico, ao “competir” com o estímulo da dor pela sua transmissão para o cérebro, leva a que a dor seja percecionada com menos intensidade, daí a sua capacidade de alívio da dor.
Há várias formas de termoterapia, tais como compressas quentes, calor húmido, parafango e parafina, banhos quentes, entre outras. O recomendado é a sua aplicação durante 20 minutos a uma temperatura confortável, para evitar queimaduras.
Tensão muscular (pescoço, lombar, etc.), torcicolos, contraturas musculares e cólicas menstruais, são alguns exemplos em que o calor pode ajudar.
As contraindicações ao seu uso são: lesões agudas, hemorragias, alterações de sensibilidade, como na neuropatia periférica (Diabetes, p.e.), queimaduras, feridas abertas, patologias vasculares, doenças infeciosas, neoplasias.
Tanto o frio como o calor podem ajudar no alívio dos sintomas, não significando isso que não seja preciso uma intervenção mais especializada, pelo que o acompanhamento pelo médico ou pelo fisioterapeuta é essencial para um tratamento eficaz!
Marta Roseiro, Fisioterapeuta, OF 3753
Referências bibliográficas: