O pavimento pélvico é o conjunto de ligamentos, fáscia e músculos localizados na base da pélvis, entre o cóccix, sínfise púbica e ísquios, com a função de suporte dos órgãos pélvicos, manutenção da continência urinária e fecal, tendo ainda um papel importante durante o trabalho de parto.
Os músculos do pavimento pélvico (MPP) têm uma função estrutural de suporte dos órgãos pélvicos, através de uma ação coordenada de contração e relaxamento, juntamente com o tecido conjuntivo envolvente e fáscia, e atuam a nível da função sexual e durante o trabalho de parto.
O relaxamento é necessário de forma intermitente durante o processo normal de micção e defecação. Perante um aumento de pressão intra-abdominal os músculos do pavimento pélvico contraem reflexivamente, promovendo o encerramento do músculo elevador do ânus, da uretra e um aumento da pressão do complexo do esfíncter anal, essencial para a manutenção da continência urinária e fecal, de gases e fezes (Eickmeyer, 2017). A contração dos músculos do pavimento pélvico promove assim um movimento de aperto.
As disfunções do pavimento pélvico (DPP) constituem um conjunto de alterações como incontinência urinária, incontinência fecal, dispareunia ou prolapso dos órgãos pélvicos, nas quais os músculos do pavimento pélvico e o tecido conjuntivo estão comprometidos, com alteração na unidade funcional de sinergia entre os músculos do pavimento pélvico e os esfíncteres uretral e anal externo e interno (Brazález et al., 2017).
Existem vários fatores de risco para as DPP, sendo que a gravidez e o parto são considerados os maiores fatores de risco etiológicos (Falkert, Willmann, Endress, Meint & Seelbach-Göbel, 2013; Secção Portuguesa de Uroginecologia (SPU), 2021). As alterações decorrentes da gravidez acentuam-se após um parto via vaginal, estimando-se que ocorra uma diminuição da função de suporte dos MPP em metade das mulheres (Johannessen, Wibe, Stordahl, Sandvik & Mørkved, 2017) e na maioria a função está normalizada um ano após o parto (Van Geelen, Ostergard & Sand, 2018).
Durante a gestação, existem diversas alterações anatómicas, funcionais e hormonais a nível muscular, tecido conjuntivo e nervoso, nomeadamente estiramento e afastamento do músculo reto abdominal, aumento de massa corporal, transferência do centro de massa anteriormente e laxidão ligamentar (Salvatore et al., 2017). Todas estas alterações levam a uma maior solicitação a nível articular e muscular, nomeadamente nos MPP (Eickmeyer, 2017), sendo que a gravidez está associada a uma descida e aumento de mobilidade do colo vesical, descida dos órgãos pélvicos, diminuição de força dos MPP e da resistência uretral (Van Geelen et al., 2018). O parto via vaginal é o fator de risco mais prevalente, sendo que este impacto é mais pronunciado no caso de parto instrumentado com recurso a fórceps (Urbankova et al., 2019), bébé com peso elevado à nascença, segundo estádio superior a uma hora, mulitparidade e lesão do esfíncter anal (Lima et al., 2020; NICE, 2021).
Existem também fatores de risco modificáveis como sedentarismo, hábitos tabágicos, obstipação e obesidade. Por outro lado, a idade, história familiar de IU, bexiga hiperativa ou de incontinência fecal (IF), tumor ginecológico ou tratamento oncológico, cirurgia ginecológica como histerectomia, fibromialgia, doença respiratória ou tosse crónica são considerados fatores de risco não modificáveis (NICE, 2021; SPU, 2021).
A Fisioterapia é uma abordagem conservadora no tratamento e prevenção de disfunções do pavimento pélvico. O plano de intervenção proposto deve ser individual e de acordo com os sintomas apresentados e causa da disfunção (ACOG, 2015; Vaughan & Markland, 2020), procurando reeducar a funcionalidade do pavimento pélvico e restabelecer o equilíbrio dinâmico abdomino-lombo-pélvico. O TMPP é definido como um exercício prescrito de modo a aumentar a força muscular, a resistência, potência, relaxamento, coordenação e ativação.
A terapia comportamental faz parte de um tratamento conservador e é uma parte importante da intervenção na IU e IF, em que se pretende alterar padrões comportamentais mal ajustados (Bø et al., 2017), por exemplo, a alteração de hábitos alimentares, do padrão intestinal, consumo ou restrição de líquidos, como ingestão de cafeína, treino vesical e exercício físico (ACOG, 2015; Bo et al., 2017; Dumoulin, Cacciari & Hay-Smith, 2018; Woodley et al., 2020; NICE, 2021; SPU, 2021).
Relativamente à atividade física (AF), é proposto exercício supervisionado, de modo a garantir que os exercícios são realizados de forma correta, e não enfraquecer assim os MPP pelo aumento de pressão intra-abdominal, que podem levar a agravamento dos sintomas. A AF faz parte de um estilo de vida saudável, pelos seus inúmeros benefícios a nível sistémico. Os fatores de risco modificáveis identificados para as disfunções do PP e sintomas apresentados devem assim ser abordados numa fase inicial, se possível previamente à opção cirúrgica ou farmacológica. A educação e estratégias fornecidas levam a uma melhoria da sensação de controlo e conhecimento da condição.
Beatriz Amaral, Fisioterapeuta